Sync / Reflexão sobre o uso


Qual seria o princípio ético do uso da sincronia automática, seja qual for o equipamento que a disponibilize? Num olhar simples, parece claro a tradicional divisão de pensamentos, onde um execra seu uso enquanto o outro encontra nele grandes valores, há um raciocínio a respeito por parte tanto de DJs quanto do público apreciador sobre o tal do sync, nome usado para falar sobre a sincronia automática, provindo do termo em inglês.

Uma das funcionalidades do equipamento é o BPM Lock. Este sistema, resumidamente, iguala de forma simples a velocidade entre as faixas discoteca das, dispensando o tradicional método de regulagem, no qual o DJ precisa realizar a tarefa usando apenas a sensibilidade de seu ouvido. 

A sincronia automática em discotecagem se difundiu fortemente através de softwares para DJ amadores, em especial o Virtual DJ, da Atomix. Neles era possível usar a regulagem de velocidade de maneira simples, através do método de BPM Matching.

O fato de este recurso facilitar e, de certa forma, reduzir a importância de um dos alicerces do DJ clássico, o ajuste do pitch, disparou preconceito por parte do universo profissional desta carreira: aquele que não dominava o pitch “de ouvido” não poderia ser considerado um DJ verdadeiro. Por conta disso, os programas para discotecagem profissional dispensavam esta tecnologia em seu repertório de recursos, valorizando o uso da técnica convencional de ajuste de velocidade, baseada em equipamentos habituais como toca-discos e CD players.

Com a popularização do DJ e o aprimoramento técnico dos programas para discotecagem profissional - por conta do nascimento da DJ Performance e a necessidade clássica de novos clientes -, a sincronia automática ganhou inúmeras formas de utilização e tornou-se mais comum. Porém, a aplicação mais usada do princípio ainda se focava no uso simples: a regulagem da velocidade entre faixas e suas sincronizações para a mixagem básica. A desvalorização do profissional que atuava com este recurso seguiu latente, e os programas para discotecagem continuaram causando insegurança naqueles que queriam migrar dos métodos tradicionais para o mundo virtual.

Os toca-discos e os CD players, neste sentido, propunham o contrário do que a sincronia automática oferecia: a valorização da técnica clássica de ajuste de velocidade, bem como a discotecagem convencional. O DJ verdadeiro seria aquele capaz de regular o pitch através de sua sensibilidade e sem depender de qualquer referência eletrônica. Por conta disso, por anos, houve grande separação entre os DJs convencionais e os de softwares. Nesta linha, o público também escolheu os artistas do método clássico como os melhores, e relegou os que usavam computadores a um segundo plano. Até hoje, tal pensamento ainda permeia o mundo da discotecagem. 

Entretanto, o mercado, observando a popularização da sincronia automática especialmente por conta de DJs amadores, deu de três dedos no debate, estendeu a ideia para várias áreas buscando abraçar mais clientes e atingiu os irmãos mais próximos dos softwares de discotecagem: os CD players. Nisso, temos o CDJ 400-350 daí por diante e o BPM Lock

Com o desenvolvimento dos softwares de discotecagem, o sync ganhou nova perspectiva. Muito mais do que realizar uma mixagem básica, a sincronia automática propõe grandes interações com itens como cue points (pontos memorizados nas faixas para acesso rápido durante suas execuções), loops(repetições de trechos musicais ou da própria música), samples (amostras e fragmentos de áudio), além da conexão simultânea com outros programas de performance e discotecagem, propondo criatividade e individualidade à apresentação

Pode parecer excesso de acidez, mas é a reserva moral de cada um, me parece, o que encaminha os artistas a usar o sync para criar apresentações épicas ou para realizar mixagens simples, considerando o ambiente da música eletrônica. A busca pelo ato completo, a apresentação cheia de inventividade e lucidez artística, é o que move muitos de nós às raves e clubs.

Não é errado usar a sincronia automática em mixagens básicas, sob o viés técnico. Concordo que, se houver resposta positiva da pista em relação ao set, qualquer forma de sincronização pode ser válida. Sei que a realização da sincronia automática depende de uma série de regulagens inclusive, especialmente em softwares, e que isso oferece algum valor ao trabalho do DJ que atua com esta prática.